A coisa grande
Aquilo parecia um sonho de tão bom que era.
Eu estava passeando com meu pai, na estrada, debaixo daquela coisa
grande.
Só de eu estar na estrada já era motivo para muita alegria, pois a mãe
sempre falava:
“não vai pra estrada não, é perigoso por causa do caminhão de leite, ele
passa em cima de vocês”
Agora, lá estava eu com meu pai na estrada, e ainda por cima, debaixo
daquela coisa grande.
Era muita alegria, meus irmãos também tava, eles ajudavam a empurrar
ela.
Eu corria de perna em perna, ela tinha mais pernas que meu pai, cai
varias vezes, mas levantava, e não chorava não. Uma vez a roda que tinha nas
pernas dela passou em cima do meu pé, doeu muito, os olhos ficaram como quando
chove, mas fiquei firme e não chorei, não podia perder aquele momento.
Tinha um amigo do meu pai ajudando, se não me engano, seu nome era Benedito.
Eu daqui debaixo dela, olhava pra cima e via meu pai rindo e falando com ele. A
visão de meu pai já me era familiar, mas naquele dia parecia mais lindo. Sempre
ele estava olhando para mim, e eu daqui de baixo via o seu nariz atrás do
bigode, isto mesmo, o meu pai falou que aqueles cabelos embaixo do nariz chamava
bigode “bidode” falava eu, "não, é bi-go-de, GO de gato” falava ele.
E assim a gente ia empurrando ela estrada a fora. Ela era alta de tal
modo que eu não conseguia relar nela nem pulando, mas era mais baixa que o pai
e o bendito, meu irmão conseguia ver por cima dela.
Pelo que eu entendi ela não tinha rodas no pé não, foi meu pai que
fez.
“que isto?” perguntei para ele enquanto serrava com aquele serrote, o serrote
que eu tinha visto era largo, este era fino e ficava no meio de uma madeira.
“estou fazendo uma roda com esta serrinha” na realidade ele fez uma para cada
perna.
Qual não foi meu espanto quanto avistei a porteira, aquilo era demais
, era muita emoção, nos íamos passar na porteira, eu gritava, pulava, caía, levantava.
era a porteira que até pouco tempo atrás eu tinha medo dela. Toda vez que
alguém passava nela ela gemia forte e depois batia uma pancada seca. Eu só
passava nela no colo. “Mas hoje não, hoje eu não estou com medo” pensei eu. Meu
pai veio me pegar, mas eu agarrei na perna dela e falei que ia passar sozinho.
Foi o Benedito que abriu a porteira, e ela gemeu um gemido alto e
forte, mas fiquei firme, fomos passando, passando, ai o Benedito, eu acho que
ele tem medo dela, saiu correndo e ela foi atrás dele e bateu forte fechando o
caminho.
Eu estava tão empolgado com a porteira que tinha esquecido que depois
dela tinha o córrego.
Quando eu vi o córrego olhei assustado para o pai, ele estendeu o
braço para me pegar, eu refugiei debaixo dela.
O córrego era lindo, com infinitas borboletas, muitas vezes de
tardezinha a gente ia lá com a mãe. Ela não deixava ir sem ela por causa do
caminhão de leite que passava em cima da gente. Por isto ela levava a gente,
inclusive meus dois irmãos que ficou com ela, “pra ela não ficar sozinha” tinha
falado meu pai.
De repente ela começou a voar, meu irmão pegou na minha mão, E ela foi
voando sobre as águas do córrego com o pai e o Benedito ao seu lado e pousou
sequinha do outro lado.
A água do córrego estava tão geladinha e gostosa que quase ia esquecendo-se
dela, mas corri e agarrei em uma de suas pernas. Para chegar em casa ele teve
de voar mais um pouquinho, pois a nossa casa ficava um pouco afastado da
estrada.
Quando chegamos em casa eu queria contar para a mãe tudo sobre ela.
“É mesa filho, ela chama mesa...” Falava minha mãe.
Hoje, depois de muitos anos eu olho para traz e vejo uma criança da
roça feliz porque eles tinham ganhado uma mesa. Você deve estar pensando: “mas,
mesa não tem rodas”.
Certo. Mas para trazer a mesa nas costas era muito longe, então meu
pai fez rodinhas de madeira, pregou uma em cada pé e veio rodando pela estrada
de terra. Com a sua criatividade ele
proporcionou esta experiência maravilhosa para seus filhos cujo valor
ultrapassa em muito a mesa em si.
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